Sandy joga pelo certo em sua estréia no jazz
Se você precisa perguntar, nunca vai saber. Foi a notória resposta de
Louis Armstrong à pergunta "o que é jazz?". Sandy sabe o que é jazz. Há
pelo menos três anos a garota tem ouvido o estilo de John Coltrane e
Sarah Vaughan em casa, nos momentos de lazer. Agora, aproveitou o
convite do evento Credicard Vozes --que se propõe a colocar cantores
famosos interpretando canções que fogem ao seu repertório tradicional--
para mostrar que, além de ouvir, pode cantar jazz.
Começando pelo começo: sim, ela sabe cantar. Afinadíssimo. Sua voz é
perfeita. Tão perfeita, na verdade, que, ouvindo-a cantar canções como
"Body and Soul" e "Cry Me a River", quase dá pra acreditar que foi um
bom show. Impossível dizer, também, que foi um show ruim. Assim é Sandy:
nem bom nem ruim nem demais nem de menos, bonitinha, afinadinha,
simpática, asséptica, assexuada. O oposto do jazz, enfim.
As mais de 400 pessoas que superlotaram a casa de shows Bourbon Street
nos dois dias de apresentação da irmã de Junior pareceram gostar.
Formada por um público genérico, sem nem tantos fãs de Sandy nem fãs
tradicionalistas de jazz, a platéia não exigiu muito. O fato de Sandy
estar ali, sozinha, cantando aquelas músicas, já era interessante o
suficiente. Não faltaram as fotos com Noely (a mãe), Lucas Lima (o
namorado), a tocaia na porta do camarim...
Sempre caxias, Sandy se esforçou. Acompanhou cada solo com olhares
interessados, reafirmou o quanto gostava de jazz e de Tom Jobim (de quem
cantou quatro músicas), reverenciou os músicos, fez tudo o que se
esperava que ela fizesse. Tudo parecia dizer: estou pronta para minha
carreira "adulta", mesmo que ela negasse que essa sua estréia solo
pudesse apontar uma separação da dupla com seu irmão.
A banda que a acompanhava, formada por músicos conhecidos das noites de
jazz de São Paulo, manteve a alta qualidade musical da noite. Nos curtos
espaços dedicados a solos de guitarra, baixo, bateria e piano, os
instrumentistas literalmente quebravam tudo, para usar um termo
tipicamente clichê do jazz. Nos momentos que exigiam maior técnica ou
intimidade com o repertório, olhavam para Sandy com aprovação,
claramente orgulhosos. Com razão. A jovem cantora não demonstrou grandes
inseguranças nem se atrapalhou com todos os desafios vocais naturais ao
jazz, mesmo ainda sendo virgem no estilo.
Sem a emoção crua de uma Billie Holiday, sem o sex appeal de uma Julie
London, sem a técnica de uma Ella Fitzgerald, Sandy não teve muitas
opções, a não ser jogar pelo certo. Faltou, deve-se dizer, a languidez
necessária para esquentar canções como "The Look of Love", tão
românticas quanto sensuais. Sandy nem corou, em compensação, quando
cantou o trecho "and this torment won't be through until you let me
spend my life making love to you" ("e esse tormento não vai terminar até
você me deixar passar a vida fazendo amor com você"), de "Night and
Day", de Cole Porter.
Na saída do show, a estudante e produtora Gabriela Ferreira, de 22 anos
--mesma idade de Sandy-- resumiu bem a sensação da noite: "É jazz, mas é
a Sandy cantando jazz, né? Se fosse outra pessoa, talvez achássemos a
voz dela aguda demais, mas, como é a Sandy, a gente perdoa".