16 de mai. de 2005

16/05 - Jornal O Povo: Solos de independência

A dupla vai gravar o 15º CD com músicas inéditas esse ano, mas aos 22 anos, Sandy não pode mais ocultar o constante e evidente distanciamento do irmão Junior na divisão de palcos, nem os regozijos solos ou junto a outros artistas da MPB. Junior também arma-se com vôos independentes junto à banda Soul Funk, de repertório black music, e ao lado de astros musicais como Marcelo D2 e Lenine.


Ela cresceu, é uma mulher que assume namoros com o companheiro Lucas Lima , já não tão castos quanto à virgindade anteriormente alardeada, mas continua com uma dulcíssima presença, cujas doses de meiguice remetem a uma excessiva infantilidade, diametralmente oposta à capacidade vocal e postura no palco que Sandy persegue profissionalmente. Enfim, a menina dá lugar à cantora adulta, que alcança com certa facilidade o domínio solo da carreira, embora negue o afastamento do irmão instrumentista e co-vocalista, Junior.

A maioridade dos 22 anos é notável em Sandy, não somente no discurso mais libertário, como nas ações e reações ponderadas como artista. Mesmo sempre acompanhada da mãe Noely e do pai Xororó, a menina que perpetuou seu talento ao lado do irmão como dupla sertaneja, que aos poucos alçou carreira romântica, enfrenta a firmeza de segurar shows e apresentações sem o auxílio fraternal, seja sozinha ou com artistas fora do seio familiar. Apesar de, desde a infância, já fazer parcerias musicais há tempos com gente grande, Sandy revela só agora seu pendor por um lado mais intimista do cancioneiro internacional.

Ela até ousou atribuir-se um estilo vocal à la Norah Jones, dada sua estréia no mundo jazzístico ao ser convidada para cantar no projeto Credicard Vozes - que já colocou Daniela Mercury e Zélia Duncan em apresentações musicais divergentes do repertório tradicional de cada uma. Assim, Sandy fez shows nos dias 04 e 05 desse mês na casa Bourbon Street, em Moema, região sul de São Paulo. Mais uma evidência do namoro dela com uma carreira solo, logo após apresentar-se com Pedro Camargo Mariano e de fazer dueto com Caetano Veloso na festa dos 40 anos da Rede Globo, no dia 26 de abril, mesmo que não esteja nos planos imediatos separar-se totalmente do irmão.

Sandy não assume o propósito de arriscar-se sozinha, mas também não desmente saber do seu potencial, na boa técnica, afinada voz e já celebradas atuações, ainda que tenha de rever algumas expressões e deixar o temor de ser sensual. Foram as medidas anotadas pela crítica sobre sua mais que boa e menos que excelente exibição no Credicard Vozes, onde, ao lado do guitarrista Jarbas Barbosa, do trombonista Bocato e de instrumentistas no baixo, bateria e piano, entoou standards do jazz, como a afogueada Body and Soul e a leve, mas lasciva, Cry Me A River, além de The Look of Love. Sandy ainda celebrou na fase também nova bossista que deve perpetuar, quatro referências ao ídolo Tom Jobim, entre clássicos estrangeiros, como Blackbird dos Beatles e a ousada Night and Day, de Cole Porter, na qual não corou em rimas e estrofes alusivas ao ato de fazer amor.

Faltou a Sandy, além da rebeldia e intensidade sexual necessárias para o jazz, o molho a mais que notabilizou as personalidades vocais de cantoras do gênero, como Billie Hollyday, Sarah Vaughan e Ella Fitzgerald, mas nada que comprometa a notabilidade dela como intérprete competente. Não se pode também, muito menos, equipará-la à banalidade pueril em que Xuxa persiste ao cantar, mas Sandy deve aprimorar-se e, até quem sabe, gravar um álbum nessa bem-vinda experiência, que pode ainda popularizar o jazz entre os mais novos. Contudo, a prioridade dela, que há três anos mergulha em estudos auditivos caseiros de Chet Backer, Ella, Sarah e John Coltrane, ainda é a parceria com Junior.

O mano de Sandy, no entanto, também elege digressões contínuas como baterista junto à banda Soul Funk, com a qual desde o ano passado faz shows com covers em tons hip-hop de Roberto Carlos, rock'n'roll e muita black music, ao lado de Marcelo D2, Gabriel ''O Pensador'' e outros artistas. Junior também pode gravar com os comparsas da Soul Funk e, no próximo 26 de maio, apresenta-se no Rio, dentro da itinerante excursão do Palco Pernambuco, projeto de Recife, que também terá esse ano palcos na cidade fluminense e em São Paulo. Junior fará duo com Lenine, mestre de cerimônias da versão carioca do evento.

Se Sandy e Junior vão gravar separadamente é uma tendência quase natural e nada longínqua, especulam. A dupla porém, permanece unida, e os irmãos finalizam juntos no próximo mês o novo CD, que é o 15º da carreira deles e virá repleto de canções inéditas. Outro fato que impede a breve separação é o sucesso e lucratividade da união, que além dos registros fonográficos, gira em torno de apresentações na TV, seriados, clipes, comerciais e até filmes no cinema. Enquanto Sandy notabiliza-se como cantora e Junior como instrumentista, categorias em que concorrem na 12º edição do Prêmio Multishow de Música Brasileira, a dupla reunida vai disputar os láureos de Melhor Show e de Melhor Clipe no dia 05 de julho, quando os vencedores da premiação serão apresentados em cerimônia no Teatro Municipal do Rio.

Enquanto isso, Sandy reverbera sua ainda singela, mas crescente independência jazz-bossanovista, enquanto Junior aprimora sua veia rock&soul-black music. Todos têm a ganhar, inclusive ambos.

Fonte: O Povo Jornal do Ceará