Durante a entrevista para esta reportagem, Maria Gadú estava radiante.
No dia seguinte, a cantora de 22 anos ouviria uma música sua pela
primeira vez na rádio: "Shimbalaiê", composta por ela aos 10 anos. Os 12
anos que separaram esses dois acontecimentos foram cheios de shows em
barzinhos, viagens, perrengues e covers de canções alheias. Agora, ela
começa a contar outra história, com direito a elogios de João Donato,
chamegos de Caetano Veloso e Milton Nascimento, aparição em minissérie e
contrato com uma grande gravadora.
Ouça 'Shimbalaiê', com Maria Gadú
A guinada que transformou a paulistana tímida, de mãe hippie, em
promessa da música até que foi rápida. Tudo começou quando um amigo a
apresentou ao diretor Jayme Monjardim, então em pré-produção da
minissérie "Maysa". Maria cantou para ele "Ne me quitte pas", um dos
hits de seus shows de bar, numa versão suingada, a léguas da gravação
dramática de Maysa. Impressionou tanto que ganhou um lugar na trilha
sonora e numa cena, em que se apresentava, de smoking, numa boate. Pouco
mais de quatro meses depois, tinha virado xodó de medalhões da MPB.
- Podem achar que ela é protegida de alguém, aparentada de alguém, mas
não é. Tudo o que conseguiu foi tocando por aí - diz Marcelo Soares,
diretor do selo Slap, da Som Livre, que lançará o primeiro disco de
Maria no mês que vem.
Minha vó era cantora lírica. Cresci ouvindo música clássica e
Adoniran Barbosa. Também gosto de Lenine, Marisa Monte, Sandy e
Júnior... - enumera.
- Desde os 13 anos, eu e minha mãe íamos a casas de música ao vivo e ela
sempre pedia aos artistas para eu cantar alguma coisa no fim. Eu morria
de vergonha. Também rolavam as festas dos amigos e parentes, né? -
conta.
A música chegou à vida da cantora ainda na infância, na escola. Aos 7
anos, já gravava, em fita cassete, improvisos musicais com uma prima.
Logo surgia "Shimbalaiê", canção de melodia contagiosa que virou uma
espécie de amuleto de Maria. É a preferida de Donato e foi a escolha da
gravadora para apresentar o trabalho da artista na rádio MPB FM. Também
foi a que a levou a compor outra vez.
A compositora, cantora e violonista Maria Gadú mal lê partitura e não
fez $do que alguns meses de aulas de violão na vida. Achou as lições
muito padronizadas. Também não aprendeu outras línguas, embora
interprete "Ne me quitte pas" com os versos originais de Jacques Brel,
num francês decorado foneticamente. A timidez, ela quebra com um jeito
atencioso que cativa da própria banda a gente como Milton Nascimento.